Comecei um post anterior da seguinte forma: "Fazer da questão da liberdade de imprensa, o foco principal dos cartoons do profeta Maomé é cair num erro." Não querendo impor ao leitor uma insterpretação única daquilo que escrevo, duvido que possam existir muitas formas de ler a frase. Assim de repente, apelando ao bom senso, não me parece ter afirmado a inexistência de um problema de liberdade de imprensa, mas apenas que, no contexto específico das relações entre essa coisa a que chamam "ocidente" e os países muçulmanos, os cartoons servem, fundamentalmente, outros propósitos. Um desses propósitos é a brutal redução das sociedades do Médio Oriente a um conjunto de estereótipos ignorantes, base das teorias do choque das civilizações. A situação nessas sociedades foi alimentada pelo apoio dos líderes das brilhantes sociedades seculares a toda a espécie de déspotas fundamentalistas, em nome de uma religião de Estado chamada nacionalismo, cujo interesse mais básico é a defesa de interesses económicos. Aliás, foi essencialmente para proteger esses interesses que os Estados Unidos condenou os cartoons. Resta lembrar que há limites, na minha opinião razoáveis, à liberdade de imprensa. A Constituição Portuguesa, por exemplo, proíbe propaganda racista. No contexto de um jornal de extrema-direita, não é totalmente claro que, junto com determinados textos de opinião xenófoba, não se possa considerar alguns dos cartoons perto de um patamar de intolerância que sei ser difícil definir. Considero-me um ocidental. Mas há muitas espécies de ocidentais, embora quase todos de sociedades seculares: os responsáveis pelo holocausto, os que colonizaram e escravizaram África, os que atiraram bombas atómicas, etc. O brilhante ocidente tem memória curta. Era bom que os seus cidadãos olhassem os fenómenos como questões complexas, em vez de os abordarem através de histerismos inconsequentes.