terça-feira, dezembro 30, 2003

O Pato?! Não conheço nem nunca me foi apresentado!

3º Episódio

A entrada no palacete fazia-se através de uma porta em pinho esculpido, mediante uma autorização concedida pelo guarda-mor do palacete, o qual estava sempre prostrado junto a uma das prateleiras que suportavam os tintos da casa.
O guarda-mor não detinha aquele aspecto disuasor e antipático de que enfermavam muitos dos outros sentinelas da ilha de Berna. Era um indivíduo sorridente e afável, sempre pronto a auxiliar o próximo que se lhe dirigisse, o que conseguia fazer sem nunca deixar de segurar permanentemente o copo de tinto na mão direita...
Ainda hoje por lá ciranda diariamente e dá as boas vindas a todos aqueles que visitam esse palacete! (e continua também com o copito na mão). Um dos verdadeiros ex-libris do Pato.
Além desta figura distinta, o Pato alberga e dá guarida a outras ilustres personagens.
Por exemplo, o especialista em compêndios actualizados das leis de jogo do futebol, principalmente na lei do fora de jogo, na qual historicamente, segundo a sua opinião, se encontram duas dimensões presentes na obra de Marx: a periodização histórica e a existência de uma metáfora central para caracterizar o espaço das relações sociais.
Assim, para este especialista das leis do fora de jogo, segurança da empresa privada Prossegur nos tempos livres, esta regra (o fora de jogo), caracteriza-se por uma periodização histórica alicerçada nas alterações produzidas ao nível da forma das leis do fora de jogo e também pelo grau de importância que a cultura, num dado momento histórico confere às leis do fora de jogo como metáfora do modo de produção capitalista.
Este segurança da Prossegur, no entanto, focaliza a sua análise, não no domínio do económico de Marx, mas na ideia de que para a correcta compreensão das sociedades é fundamental percepcionar a dimensão cultural das leis do fora de jogo.


Segue dentro de momentos ...

segunda-feira, dezembro 29, 2003

O Pato?! Não conheço nem nunca me foi apresentado!

2º Episódio

Não obstante a manifesta dissensão entre os aventureiros que fundaram as suas feitorias em distintas ilhas, sobre as cores mais bonitas, acordaram eles eleger um local neutro para estabelecerem conversações regulares acerca de diversos assuntos que estavam na primeira linha das agendas naqueles tempos, entre eles a afamada Teoria do Caos, as Leis de Murphy, a escola checa de escritores, a sucessão, no SLB, daquele grande homem que ganhando 70 contos mensais, detinha uma casa na Quinta da Marinha e um helicóptero por um mui casto advogado que se perfilava no horizonte (houve alguns, incluindo este escriba, que vaticinaram correctamente o destino que estava traçado para este honesto advogado...)
Foi assim que no ano da Graça de 1995, algures entre Setembro e Dezembro, foi eleita a ilha que iria estar, de futuro, para estes aventureiros, como a Suiça oficialmente esteve para a 2ª Guerra Mundial.
Inspirados pelo exemplo suíço, foi unanimemente aclamada como local de assembleia a ilha de Berna. Das várias urbes que compunham esta ilha, os navegadores escolheram a urbe do Pato como aquela que melhores condições proporcionava para acolher as suas reuniões.
Feitas as primeiras vistorias à urbe com vista a detectar algum tipo de anomalia e disfuncionalidade nos diversos equipamentos desta urbe (era imperioso que todos os equipamentos cumprissem as normas de qualidade ISO 9069), e não tendo sido registados muitos atropelos à futura segurança dos navegadores (a excepção maior dizia respeito aos bolos que eram vendidos nesta urbe, principalmente as pirâmides de chocolate ...), acordaram eles efectuar as suas magnas sessões num palacete que se situava contíguo à rua “La Cuisine”, cuja decoração com uma miríade de castas vitivinícolas foi suficiente para convencer e inebriar os navegadores ...

Continua amanhã, em princípio ...

domingo, dezembro 28, 2003

Rectificação da calúnia atentatória

Em relação ao post "De Plástico", publicado por este blogue há coisa de dias, cabe dizer, depois das reclamações justas do jornalista Miguel Góis, que, de facto, não temos nenhumas provas que confirmem minimamente a relação entre o seu conteúdo e a notícia do Inimigo Público de 19 de Dezembro que tratava de forma similar a detenção de Saddam Hussein. Deste modo, não havendo provas, a sugestão de plágio foi pura calúnia. Esperemos que este post sirva para minorar os previsíveis danos que possam ter sido infligidos ao jornalista Miguel Góis. Voltamos a lamentar, com veemência, o sucedido.

sexta-feira, dezembro 19, 2003

Notoriedade

Entrámos no universo da imagem. É discutível que a escolha do Abel Xavier tenha sido a mais simbólica. Seja como for, desde a capa do último romance da Margarida Rebelo Pinto que não via nada tão colorido. Saudades do vermelho. Outro acontecimento merece regozijo: fomos plagiados. O Inimigo Público reproduz na terceira página a história do Saddam de plástico atribuindo as nossas informações, frescas de Bagdad, ao Chomsky. Nada mau.

O Pato? Não conheço nem nunca me foi apresentado!

1º Episódio

É justo atribuir-se a façanha da descoberta do Pato a dois cidadãos portadores de um espírito aventureiro, ávidos pelo risco e desejosos de alargar a sua vivência para fora dos muros da faculdade, na altura ainda desprovidos de um armamento de baionetas a encimá-los, como sucede desde há algum tempo a esta parte...
Depois de arribarem ao novo mundo, acorreram a enviar a boa nova aos colegas, prometendo-lhes, acaso lhes fizessem companhia nas próximas viagens, honrarias tais que fariam com que os ganhos atribuídos pelo Governo ao Citigroup no processo de titularização de dívidas fiscais à Segurança Social parecessem simples migalhas...
Após longas negociações, que envolveram a determinação do horário que contemplava as viagens a serem feitas ao “novo mundo”, nomeadamente o facto de um dos descobridores ter que estar, imperativamente, todos os dias em Queluz a partir das 3 horas da tarde, ou das 4, ou das 5, ou das 6, ou ... os colegas, convencidos, lá acederam a colocar as suas vidas em risco e partirem à conquista de novos mundos.
Nos primeiros tempos as naus navegavam a grande velocidade, percorrendo muitos nós por dia, graças às suas velas triangulares, as quais eram tecidas com o mais puro algodão do reino, e apresentavam-se tingidas com diversas cores (azul e amarelo, laranja, rosa, vermelho...).
Decorridos 4 meses de viagens sucessivas, muitas delas enfrentando a fúria de Possêidon devido a estes jovens navegadores se terem furtado, nalgumas vezes, a pagarem a portagem por atravessarem os seus oceanos (Possêidon foi o criador do conceito de utilizador-pagador nas auto-estradas marítimas. Nem podia ouvir falar em SCUTS!), um grupo de navegadores avistou uma ilha que povoava o imaginário há muito tempo de muitos habitantes do antigo quartel do exército, a ilha da Utopia!
Aportaram imediatamente a essa ilha, e enviaram sinais de fumo aos outros navegadores para lhes darem a visitar e conhecer as delícias dessa fértil ilha, inclusive de uma certa planta opiácea...
Este chamamento não foi suficiente para “encantar” alguns dos navegadores que tinham preferido outras ilhas para construírem uma nova vida, nomeadamente uma grande ilha que era muito próspera nos anos mais férteis, a grande ilha das laranjas!

Continua assim que possível!...


quinta-feira, dezembro 18, 2003

Leõezinhos

"Entrámos a dormir"
"Tivemos falta de concentração competitiva"
"Na primeira parte tivemos uma atitude passiva"


Sabeis, porventura, de quem é a autoria destas frases?
São do treinador de um grupo de rapazes que ganham mais num mês do que 80% da população portuguesa durante toda uma vida de trabalho...
São do treinador de um grupo de rapazes que para verem creditadas mensalmente centenas de milhares de euros nas suas contas bancárias apenas têm que fazer um jogo de futebol por semana...
São do treinador de um grupo de rapazes que sempre que transformam por "artes mágicas" um cenário de muitos milhões de euros num palco de vergonha para a camisola que envergam, acorrem nos dias seguintes a proclamarem, em alto e bom som, sucessivas jeremíadas, lamúrias e queixumes sobre a incompreensão a que são votados pelos sócios e adeptos, porque ninguém mais do que eles entra sempre de forma determinada, como se vê pelas declarações do treinador, para dentro de campo para lutar pela vitória nos jogos...
Depois da aclaração da realidade madrasta que situa o dia-dia destes rapazes, já é mais fácil de perceber quem é o autor das frases, certo? E a análise que ele faz do comportamento e das atitudes profissionais do seus rapazes, também, não é?
Ah, como é possível que os sócios e adeptos não compreendam aqueles rapazes?!...

quarta-feira, dezembro 17, 2003

Ensaio sobre o comércio

Pois é, consta que uma das principais razões que suportam a intenção do Real Madrid em adquirir o Abel Xavier passa pela possibilidade da sua imagem ser explorada comercialmente. Acabou o tempo dos jogadores de barba rija com penteados como o do Manuel Fernandes ou o do João Pinto do FCP e bigodes como o Oliveira o Toni ou o Humberto Coelho, homens que se assoavam para o chão e puxavam os pêlos dos sovacos aos adversários durante a marcação dos cantos. Agora, para ser bom jogador é preciso mudar de permanente todas as semanas, fazer madeixas, cuidar das unhas e cheirar bem. Rapidamente os empresários vão ser substituídos pelos cabeleireiros, o Fernandinho é da Isabel Queiroz do Vale, o Manecas do Paulo Vieira. Fernando Aguiar volta que estás perdoado.


Pedradas

É de elementar justiça fazer aqui o elogio à qualidade indiscutível de um blogue que já é, sem dúvida, uma referência no espaço virtual. Granito de seu nome (podem aceder na entrada aqui do lado direito), é um espaço de debate inteligente, onde a escrita irrepreensível se une à justeza do comentário. Figuram entre os afamados escribas, nomes que dispensam qualquer apresentação como o inimitável Vasco Palouro das Neves. Quem sabe se alguns dos seus comentários mereceriam resposta aqui no nosso mais modesto forum?

Ensaio sobre a cegueira

Abel Xavier poderá ser o novo jogador do Real Madrid. O defesa português interessa a Carlos Queiroz, que pretende reforçar a defesa madridista (...)
Público, 17-12-2003

Eu sei que a quadra é natalícia, que a bondade e o altruísmo devem governar os espirítos por estes dias, mas desconhecia que o amor ao próximo sentido por Queiroz nestes dias chegasse a este grau de masoquismo!...

terça-feira, dezembro 16, 2003

We´ve got him!!!

A captura de Saddam pelas forças ocupantes do Iraque, (independentemente da concordância ou não com a invasão, é um dado com que nos devemos congratular, apesar de ser o único motivo decorrente da invasão para congratulações até hoje, e talvez o último ...), anunciada de forma estridente (até pensei que tinham encontrado as armas de destruição maciça...), cuja maior celebração que visualizei nas imagens televisivas proveio de iraquianos que embandeiravam alegremente umas bandeiras vermelhas com uma foice e um martelo ao cimo (ironia das ironias), foi comentada pela ministra portuguesa dos Negócios Estrangeiros, com natural, legítimo e partilhado regozijo, acrescentando que tinha obtido conhecimento da captura por intermédio dos noticiários radiofónicos...
É caso para dizer: Mas que imensa falta de respeito dos líderes da coligação para com a “gente” !!!
Então andamos nós a enviar para o Iraque os nossos GNR´s, abrimos as portas do país à recepção do Presidentes dos dois países, oferecemos-lhe uns saborosos bifes açorianos, com vinho de Porto e queijo Terra Nostra como aperitivo e umas farófias apuradinhas como sobremesa, e estes nem sequer se dignaram a informar os nossos governantes sobre o maior feito cometido pela coligação do eixo do bem no Iraque?!
Bastava um telefonema a dizer: Durão Burroso (é assim que lhe chamam na Casa Branca...), my friend, we´ve got him!!!


segunda-feira, dezembro 15, 2003

De Plástico

O enviado do Grupo do Pato a Bagdad, Al Cajó, confirmou em primeira mão, após perigosas diligências, que a figura de Saddam que vimos, depois da sua detenção, em todas as televisões do mundo era feita do mesmo material do perú que George Bush carregava nas comemorações do Dia de Acção de Graças. A grande dificuldade em reproduzir exactamente todas as características de Saddam, levou o Pentágono a contratar vários especialistas. Fontes próximas asseguram que José Lamego colaborou nas pinturas do boneco do ex-líder iraquiano, aproveitando a grande experiência acumulada nos tempos em que pintava murais para o MRPP. Só assim se explica o facto do Saddam ter uma barba cujo modelo não é outro que não o próprio Karl Marx. Entretanto correm rumores que o Próprio George W. é um boneco de plástico. Mas estas fontes, segundo Al Cajó, são menos seguras, já que há fortes indícios que seja um fungo gigante.

quinta-feira, dezembro 11, 2003

E esta, hein!...

O governador do Banco de Portugal afirmou ontem num debate promovido pela União das Associações do Comércio e Serviços que "o problema orçamental português é mais sério do que se imagina"

Quem diria?!
Depois de ter ouvido a Ministra da Economia e Finanças asseverar que a política económica seguida até agora vai-se manter inalterável, seria de pensar que as coisas estivessem muito melhor...
Pelo vistos a Ministra é adepta daquela excelsa solução de dar um passo em frente quando se está à beira do precipício...
É uma desportista radical, certamente...

quarta-feira, dezembro 10, 2003

BT

O major-general Manuel Apolinário, apresentado anteontem como novo comandante da Brigada de Trânsito da GNR, está a ser investigado pela Polícia Judiciária Militar, o que vai obrigar o Governo a procurar uma outra alternativa.

Após uma infinidade de recusas anteriores, logo agora que parecia estar encontrado o homem com o perfil ideal para o lugar (afinal de contas o homem apresenta um currículum invejável para dirigir a força policial em questão: de acordo com o DN, Manuel Apolinário "tinha e tem vários processos a correr") é que tinha de acontecer isto ...

terça-feira, dezembro 09, 2003

O fim de um mito

Em 2300, Portugal poderá ter uma população total de pouco mais de oito milhões, indicam dados hoje divulgados pela ONU.

Nessa altura já não será mais possível dizer que há seis milhões de benfiquistas no país! Caminhamos para o fim de um mito, portanto ...

Diga lá outra vez?

O apresentador Carlos Cruz vai recorrer junto do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos contra a Justiça portuguesa pela sua alegada prisão ilegal e pede uma indemnização de dez milhões de euros, valor estimado em torno do que poderia receber se trabalhasse até aos 70 anos.

Então a reforma não é concedida, no máximo, aos 65 anos?!
Parece-me que o Carlos Cruz quer fazer ao erário público o que consta que fez às crianças casapianas..

quinta-feira, dezembro 04, 2003

ciganos e narcisos

A diferença entre o racismo primário e o racismo complexo. Os pais das criancinhas brancas que frequentam uma escola preparatória em Bragança (sim, a cidade das prostitutas brasileiras) não querem que os filhos dos ciganos partilhem a escola com o seus rebentos. O responsável pela educação na região veio dizer que isto não pode ser, porque meter os ciganos na escola enquanto pequenos é a forma de evitar que eles arranjem problemas quando forem grandes. Palmas para o senhor. Entretanto, mais a sul, Narciso Miranda decidiu realojar umas quantas famílias de ciganos nuns barracões pré-fabricados, porque, segundo ele, os ciganos não gostam de morar em andares. Para explicar melhor a sua posição Narciso resolveu fazer um exercício comparativo, ora então, disse o edil, imagine o que era colocar deficientes num último andar de um prédio, não podia ser, porque os pobres não conseguiam descer para a rua. Realmente, nunca tinha pensado nisso.

E agora algo completamente diferente ...

O Ministério das Finanças chegou a ponderar a possibilidade de cobrar IRS aos militares da GNR que estão em missão no Iraque mas, quarta-feira, o comandante-geral da GNR revelou à TSF que isso não vai acontecer.O Ministério das Finanças chegou a ponderar a possibilidade de cobrar IRS aos militares da GNR que estão em missão no Iraque.
Isto porque o artigo 42 do decreto-lei que define as isenções fiscais diz que ficam isentos deste imposto os militares e elementos das forças de segurança em missões «com objectivos humanitários ou destinadas ao estabelecimento, consolidação ou manutenção da paz, ao serviço das Nações Unidas ou de outras organizações internacionais», o que não é declaradamente o caso.
Entretanto, ontem, o comandante-geral da GNR revelou à TSF que os militares que estão no Iraque podem ficar descansados porque não vão fazer descontos para o IRS.
«Para o comando da Guarda - o nosso entendimento e a nossa leitura - é que não havia razão nem motivo para que fosse feita qualquer retenção na fonte em sede de IRS», disse Mourato Nunes.
«Se eventualmente houvesse outro entendimento, nomeadamente por parte das Finanças, procuraria resolver o assunto», afirmou!!!
Não se tornou necessário porque este também era o entendimento das Finanças e do Ministério da Administração Interna», salientou Mourato Nunes.

Ora,ora, digam lá se este não é um Governo de excepção?! Nomeadamente no cumprimento das leis!
Mas pelo menos é coerente! Segue de violação da lei em violação da lei... O entendimento reinante é que se existe uma lei é para se fazer letra morta dela, principalmente se a pressão for feita pela acção colectiva de certos grupos de interesse...
Ai Cristo, vem cá baixo ver isto!...

Haja dinheiro ...

O que não vale ter um número de deputados suficiente para fazer a diferença nas votações parlamentares ...

"Ferreira Leite Permite à Madeira Violar Endividamento Zero"
Apesar de ir contra a lei do OE para 2004, a ministra das Finanças deu parecer favorável a mais um empréstimo a contrair pela Madeira no montante de 35 milhões de euros, verba necessário para cobrir o défice do Orçamento da Madeira para 2004 (...)
Além deste empréstimo, Ferreira Leite autorizou mais uma série de procedimentos que permitem ao governo regional ter acesso a 107 milhões de euros.
Por tão generosa dádiva num total de 107 milhões de euros, não incluindo as citadas receitas fiscais extraordinárias ainda não quantificadas, a ministra das Finanças mereceu, no início da discussão do orçamento regional, um rasgado elogio do secretário do Plano e Finanças. Para este governante, as medidas revelam a "forma séria e responsável com que [a ministra] tem encarado a resolução dos problemas pendentes". Ventura Garcês adiantou ainda: "Se mais não tem feito pela Região é porque a situação herdada das finanças públicas o não tem permitido." (...)
Entretanto, a dívida regional, directa e indirecta, aproxima-se dos 1 500 milhões de euros estimados pelo PÚBLICO em 13 de Novembro, ou seja, de um valor superior ao do próprio Orçamento da Madeira para 2004 (1,42 milhões de euros)...

Público, 04-12-2003

quarta-feira, dezembro 03, 2003

Às armas, às armas II

De acordo com a nova legislação relativa ao licenciamento do porte e uso de armas, que irá ser submetida a aprovação pelo executivo português, e onde consta a menção "brilhante" de que não é exigida a demonstração obrigatória, por parte do requerente, de que o porte de arma é fruto de uma "necessidade imperiosa" ...,todos os cidadãos a quem for concedida a licença terão que fazer, pelo menos, cem disparos por ano, para ser avaliada e aprimorada a pontaria do cidadão!!!
Agora sim!
Até podemos ter níveis de qualificação escolar e profissional baixos, dívidas bancárias elevadas, caos urbanístico em quase todo o litoral do país, calotes fiscais aos milhares,etc,etc, mas em breve passaremos a ser, com o "financiamento" das empresas de produção de munições, os atiradores mais certeiros do mundo!!!

Às armas, às armas I

O presidente norte-americano assinou, na passada segunda-feira, uma lei que vai atribuir 5,2 mil milhões de euros para os programas nucleares no ano fiscal de 2004, visando a pesquisa de uma nova geração de armas nucleares.
Com a administração de G.W.Bush é mesmo como diz o ditado: "Bem prega Frei Tomás. Faz o que eu te digo mas não faças o que faço" ...

Campanha de privatização de notáveis

Estive a pensar, com a angústia a que a situação obriga, o que fazer deste país, como ultrapassar a crise que nos corrói o amâgo da pátria. Passei dias em bibliotecas, noites mal dormidas, até que, num golpe que apenas posso atribuir à influência divina (obrigado Karol pelas tuas orações), deparei, numa singela, aparentemente inofensiva e mal iluminada prateleira de uma livraria mal frequentada, com as obras de Milton Friedman e Von Hayek. Foi uma autêntica epifania. A doutrina neo-liberal é do caraças, do melhor que já vi, tanto tempo perdido no marxismo, tanta pomba assassinada. Pois bem, devorei os compêndios, linha por linha, página por página. Converti-me em absoluto e, passo a modéstia, acho que superei os próprios mestres.
É falso que a doutora Manuel das finanças esteja a delapidar o património público para cobrir o sacrossanto défice. O património público é infindável pois a nação ainda não alienou o que tem de melhor: os portugueses. Não falo do comum trabalhador, que como sabemos é preguiçoso e não faz nenhum, mas dos nosso notáveis, essa gente tão extraordinariamente inteligente. Proponho, para não darmos logo cabo das jóias da coroa, que sejamos contidos no início deste processo. Deste modo, acho que podiamos vender o José Manuel Fernandes, o Luís Delgado, o Telmo Correia, o João Carlos Espada, o João César das Neves e a Maria de Fátima Bonifácio. Escolhi-os porque acho que estão em melhor condição que ninguém para compreender este esforço pelo bem da nação. Entregamo-los aos desígnios do mercado, que ele decida se valem ao não alguma coisa.

domingo, novembro 30, 2003

Fome

Aos fundamentalistas da caridade: nunca se deve confundir a caridade com os direitos. Sorriso perverso e venenoso o da caridade. De boas intenções ...

1 de Dezembro de 1640

Na véspera da comemoração do 363º aniversário da Restauração da Independência, é altura de dizer, em jeito de balanço, "Volta Miguel de Vasconcellos! Estás perdoado, estás perdoado..."

sexta-feira, novembro 28, 2003

Um país à beira de um ataque de nervos

De acordo com informações veiculadas ontem no Congresso Nacional de Psiquiatria, mais de 60% dos portugueses adultos tomam benzodiazepinas (príncipio activo dos ansiolíticos) e destes, metade fá-lo sem prescrição médica.
Se ainda haviam dúvidas de que este é um país à beira de um ataque de nervos, notícias deste tom demonstram-no à saciedade...
Todavia, sendo esta percentagem tributária de cálculos obtidos até à passada semana, permitam-me duvidar da fidedignidade actual deste valor. Passo a aduzir, a título de exemplo, 4 acontecimentos ocorridos esta semana no país que sustentam a minha asserção:
Em primeiro lugar estes números já não correspondem à verdade, uma vez que foram avançados antes do Sporting ter jogado com os turcos do Genclercibliliglibidebimi. Desde então, foram muitos os sportinguistas que se viram na contingência de ingerir imediatamente umas caixas de ansiolíticos para adormecerem por uns dias e não se recordarem do que viram...
Em segundo lugar, depois do beneplácito que o Governo português concedeu esta semana a alemães e franceses para estes exercerem o seu livre arbítrio no (não) cumprimento do PEC, muitos milhares de portugueses ficaram de tal modo baralhados com a visão dual que o Governo tem sobre este instrumento de disciplina orçamental, que foram obrigados a recorrer ao consumo de umas benzodiazepinas para readquirirem o equilíbrio entretanto perdido.
Em terceiro lugar, estes números não contemplam ainda os utentes da Carris, os quais se deparam semanalmente com greves (ainda que legítimas) dos motoristas que os obrigam a gastar semanalmente umas pipas de massa em táxis, em acréscimo ao custo dos passes de transporte que indexam mensalmente à Carris.
Em quarto lugar, também não foram contabilizados os 128 militares da GNR que acorreram em massa às farmácias de Nassíria para comprarem ansiolíticos depois de terem sido informados (no Iraque) que estarão sujeitos a descontar para o IRS como "todos" os cidadãos deste país.
Como vêem, somando apenas estes factos semanais facilmente se percebe que estes números pecam por serem escassos, daí a necessidade de uma actualização da percentagem de portugueses que recorrem aos ansiolíticos para mergulharem num entorpecimento que lhes permite enfrentar melhor o dia-a-dia...

quarta-feira, novembro 26, 2003

Cobrança de IRS à GNR

O Governo está a analisar se a missão do Subagrupamento Alfa da GNR no Iraque está ou não isenta de IRS. Uma decisão técnica que será tomada pela Direcção Geral das Contribuições e Impostos (DGCI).
O artigo 42 do decreto-lei que define as isenções fiscais em missões de salvaguarda de paz diz que é o Ministério das Finanças que tem competência para reconhecer, ou não, a isenção de IRS.
O mesmo artigo diz que ficam isentos deste imposto os militares e elementos das forças de segurança em missões «com objectivos humanitários ou destinadas ao estabelecimento, consolidação ou manutenção da paz, ao serviço das Nações Unidas ou de outras organizações internacionais».
No entanto, a GNR não está ao serviço das Nações Unidas nem enquadrada no âmbito de uma organização internacional. Entretanto, os ecos provindos do Iraque dão conta que entre os soldados e oficiais da GNR a indignação é geral!
Em primeiro lugar, mais uma vez se demonstra que apesar da série de adiamentos, supostamente visando limar todos os preparativos para a missão, o Ministério das Finanças esqueceu-se de dizer aos "voluntários" da GNR quando estes ainda estavam em Portugal (pelo menos àqueles que não sabiam) que a missão deles não se enquadrava nem no âmbito da ONU nem de qualquer outra organização internacional, e que por isso mesmo os seus vencimentos não seriam objecto de isenção fiscal. Falta saber se esse lapso de informação do MF foi propositado ou não...
Em segundo lugar, tendo, pelo menos agora, conhecimento desta norma, espanta-me que os "voluntários" da GNR, portadores indómitos de um espírito humanitário que seria dedicado em prol da população iraquiana, nas palavras do douto dirigente do PP, Pires de Lima, não tenham o mesmo espírito em relação aos seus compatriotas, uma vez que cumpre a todos o pagamento de impostos devido aos salários que se auferem.
É que não basta ser-se solidário com os iraquianos. Há que ser solidário também com os portugueses (pelo menos com aqueles que também pagam impostos).
Caso tal não suceda até poderão surgir nas mentes dos portugueses indícios dubitativos se o inaudito zelo humanitário que os "voluntários" da GNR transportaram consigo até ao Iraque, conforme propugnaram alguns responsáveis políticos, mais não era do que um argumento capcioso e espúrio para esconder o verdadeiro móbil do seu "voluntarismo"...
Os responsáveis governamentais e os soldados e oficiais da GNR concerteza não quererão que os portugueses pensem isso, pois não?

Então?

Há quase vinte e quatro horas que o papa disse que ia rezar por Portugal mas isto está tudo na mesma. Karol, mais convicção nas aves marias.

terça-feira, novembro 25, 2003

Recursos Humanos e McJobs

"Passados poucos meses estava sentado na Sunset Place a admitir e a despedir como um demónio. Assim Deus me ajude como aquilo era um verdadeiro matadouro. Não fazia sentido absolutamente nenhum. Era um desperdício de homens, de material e de esforço, uma farsa hedionda representada com um pano de fundo de suor miséria. Mas, assim como aceitara espiar, assim aceitei admitir e despedir, e tudo o mais que isso implicava. Dizia «sim» a tudo. Se o vice-presidente decretava que não podiam ser admitidos aleijados, eu não admitia aleijados. Se o vice-presidente dizia que todos os boletineiros com mais de 45 anos deviam ser despedidos sem aviso prévio, eu despedia-os sem aviso prévio. Fazia tudo quanto me mandavam fazer, mas de maneira que eles o pagassem. Quando havia greve, cruzava os braços e esperava que terminasse, mas primeiro tratava de os fazer perder umas boas massas. Todo o sistema estava tão podre e era tão desumano, tão irremediavelmente corrupto e complicado, que seria preciso um génio para lhe insuflar um certo sentido ou uma certa ordem, para já não falar em bondade ou consideração humanas. Tinha pela frente todo o sistema americano de trabalho, que estava podre por dentro e por fora. Era a quinta roda da carruagem e nenhum dos lados tinha qualquer serventia para mim, a não ser para me explorar. Na realidade, toda a gente estava a ser explorada: o presidente e a sua seita pelos poderes invisíveis, os empregados pelo público, etc., por aí fora, através de toda a rede. Do meu poleirozinho em Sunser Place tinha uma vista geral de toda a sociedade americana. Era uma página tirada da lista telefónica. Alfabeticamente, numericamente e estatisticamente, fazia sentido. Mas quando a olhavamos de perto, quando examinávamos as páginas separadamente, ou os componentes separadamente, quando examinávamos um só individuo e o que o constituía, o ar que respirava, a vida que levava e os riscos que corria, então víamos algo tão sujo e degradante, tão baixo, tão miserável, tão completamente desesperado e sem sentido, que era pior que olhar para um vulcão. Via-se toda a vida americana: economicamente, politicamente, moralmente, espiritualmente, artisticamente, estatisticamente e patologicamente. Parecia um grande cancro sifilítico num caralho gasto."
In: Trópico de Capricórnio de Henry Miller.

Dias da Cunha

O Woody Allen realizou em tempos um filme chamado "Os Dias da Rádio", onde retratava a América dos anos trinta e quarenta. Em Portugal, falta quem crie um grande épico nacional que se podia adequadamente chamar "Os Dias da Cunha".

segunda-feira, novembro 24, 2003

A festa da Taça

Eram memórias que datavam de tempos que me parecem hoje bastante remotos, quando o clube da terra disputava, alternadamente, a 3ª divisão e o Distrital da Associação de Futebol de Viseu.
Nesses anos, a vivência do jogo fazia-se também ali, junto às linhas de campo marcadas com cal, junto dos bandeirinhas e dos bancos de suplentes das equipas, e sempre acompanhada com os comentários dos adeptos às incidências do jogo e aos intervenientes.
No entanto, com a passagem dos anos esses memórias foram-se gastando, desvanecendo aos poucos e poucos até que ontem puderam ser novamente vividas junto à linha lateral do campo de jogos do 1º de Dezembro.
Desta vez não era o Lusitano de Vildemoinhos que jogava com o Mangualde, o Lamego, o Viseu e Benfica ou o Tondela. Era sim o Sporting contra o 1º de Dezembro.
O campo de jogos do 1º de Dezembro ainda é mais pequeno do que aquele onde passei muitas tardes na infância. Lá os lugares não são marcados, nem sequer existem cadeiras na bancada. O pessoal ou fica de pé no peão ou então senta-se no cimento da bancada. Houve ainda quem tivesse ficado nas árvores ou nos postes de iluminação ...
Optando nós por ficarmos de pé, junto do banco de suplentes que viria a ser ocupado pela equipa do Sporting, estávamos a dois metros da linha lateral do sintético. Tivemos que ir cedo para arranjarmos um lugar de onde fosse possível ver (quase) todas as incidências do jogo. Alguns que chegaram mais tarde não puderam ficar tão "confortavelmente" instalados e logo começaram a vociferar contra as condições que o campo oferece. Ripostou em alto e bom som um adepto com um cachecol do SCP: "O que é que querem? Cadeiras aquecidas? Isto é Taça!" Tinha razão, a Taça é mesmo assim.
Outro pormenor onde se viu claramente que era Taça. A equipa do SCP entrou em campo para os exercícios de aquecimento e os adeptos da equipa da casa imediatamente aplaudiram em uníssono os adversários.
Dado o pontapé de saída, à medida que um claro equilíbrio entre as duas equipas pautava o jogo, a insatisfação crescia nos adeptos do SCP.
Graças à "especificidade" do campo, essa insatisfação era directamente dirigida aos ouvidos do treinador e dos jogadores do SCP :
"Ó Fernando Santos, vê lá se fazes por merecer o ordenado que nós te pagamos!"; "Clayton, pressiona o guarda-redes, pá! Aposto que se ele tivesse lá o cheque do teu ordenado ias logo atrás dele a correr!"; "Ó Mister, já vi jogos de casados e solteiros melhores do que este!"
Com o intervalo veio mais uma substituição no Sporting. Pouco agradados com a permanência em campo de Clayton (eu próprio discordava da sua continuação), um adepto prontamente transmitiu a discordância aos ouvidos do treinador: "Ó mister, devia era ter tirado o Clayton. O rapaz (Paulo Sérgio) até estava a jogar bem!". Ao que o treinador respondia com indicações para dentro do campo: "Joguem a bola pelo chão, pá. Não vêem que salta muito?!", ou "Ó Tonito, passa a bola pra frente. Não quero passes para trás, fod.."
Com os golos e a definição do vencedor, ainda assim os adeptos do SCP não se eximiram de fazer chegar aos ouvidos dos jogadores a sua opinião: "Ó Luís Filipe, vê lá se corres, pá! Pareces uma andorinha!" "Estão satisfeitos com o 1-0? Isso, defendam porque é um óptimo resultado contra uma equipa da 3ª divisão, car...".
Mas como nem tudo eram críticas, quando a bola se aproximava da linha lateral o público por vezes saudava alguns jogadores: "Ó Chaves, tá tudo bem?", ao que o Chaves respondeu levantando o polegar para cima, ainda quando um dos suplentes da equipa da casa se levantou para fazer aquecimento, indo ter com uns amigos à linha, dizendo-lhes ao mesmo tempo que se ria: "Isto tá complicado para eles, hein!", ou quando um adepto dirigiu o seu pedido: "Ó Liedson, vais-me dar a tua camisola no fim do jogo, não vais ?", ao que Liedson respondeu, acenando negativamente com a cabeça.
Já perto do final, o jogador Tonito numa disputa com um adversário sofreu um corte na cabeça que o deixou a sangrar. Estava dado o mote, criado um modelo para um adepto, pelo menos avaliar pelo seu incentivo: "É assim mesmo, Tonito!" Há que sangrar a camisola!"

Por fim, com o apito final, e sob os aplausos dos adeptos caseiros e forasteiros, o treinador do SCP levantou-se, olhou para um dos postes de iluminação onde estava um adepto do SCP, sorriu e seguiu em direcção aos balneários.
O que é que querem? Isto é Taça!

quarta-feira, novembro 19, 2003

Queres dinheiro? Vai ao Totta

Foi publicada na semana passada a notícia de que dentre todos os bancos (todos eles incumpridores habituées e reincidentes, em maior ou menor grau, da legislação relativa ao pagamento de horas extraordinárias aos seus funcionários), o Banco Totta tinha sido aquele onde os inspectores tinham encontrado o maior número de violações à Lei.
Só nesse banco o número de horas extraordinárias prestadas pelos trabalhadores à entidade patronal e que não lhes foram pagas totalizavam cerca de 2.000.000 milhões de Euros. O sindicato bancário, em forma de protesto, visando consciencializar os trabalhadores para este incumprimento patronal, deslocou-se a várias agências deste Banco e de outros, denunciando a existência de trabalho escravo promovido por entidades que correntemente compram espaço publicitário em diversos jornais para publicitarem aos seus accionistas e ao público em geral os seus faustosos lucros, incluindo-se neste caso o Banco Totta.
Após reunião de emergência o Conselho de Administração, a coordenadora de Recursos Humanos do Banco Totta, sem nunca desmentir a veracidade das violações laborais cometidas, comunicou aos trabalhadores e à imprensa que as informações veiculadas pela comunicação social estavam a pôr em causa a boa imagem do Banco que tanto tempo demorou a construir...
Em vez de ecoar lamúrias sobre a desgraça da imagem do Banco junto do público que as notícias estavam a provocar, melhor seria que a coordenadora e os responsáveis do Banco interiorizassem que não basta o marketing para se edificar uma boa imagem de um Banco junto dos cidadãos, mas sim que cumprissem a legislação laboral em questão, evitando que a tal boa imagem não deixe de assentar em voláteis castelos de cartas.
Isto porque a tal boa imagem requer que as entidades patronais, públicas ou privadas, possuam uma ética que postule o respeito pelos direitos dos trabalhadores e não atropelem estes descaradamente. Concerteza que se uma parte do dinheiro gasto em publicidade para a promoção da imagem do Banco ou uma escassa parcela dos gordos lucros anunciados tivesse sido canalizada para remunerar os trabalhadores do seu exercício de actividade, esta situação não se punha com a acuidade que surge frequentemente à estampa, e a coordenadora não estaria agora tão preocupada com os efeitos nocivos que estas notícias causam para a boa imagem do Banco.

P.S- Destronado pelo Banco Totta, o crónico vencedor do desrespeito pela remuneração das horas extraordinárias dos seus funcionários, o BCP foi relegado para o segundo lugar da lista.
Apesar desta sensível melhoria, ainda assim seria justo que nos novos anúncios publicitários deste Banco, para além dos "mil sorrisos", "mil vontades", etc, fossem aduzidas frases como "mil horas extraordinárias por pagar", "mil calotes aplicados aos funcionários", "mil violações da Lei", and so on ...

terça-feira, novembro 18, 2003

Ent�o...

Come�o a pensar que ninguem gosta de Chico Buarque...

terça-feira, novembro 11, 2003

MEU CARO AMIGO

Meu caro amigo me perdoe, por favor
Se eu não lhe faço uma visita
Mas como agora apareceu um portador
Mando notícias nessa fita
Aqui na terra 'tão jogando futebol
Tem muito samba, muito choro e rock'n'roll
Uns dias chove, noutros dias bate sol
Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta
Muita mutreta pra levar a situação
Que a gente vai levando de teimoso e de pirraça
E a gente vai tomando que, também, sem cachaça
Ninguém segura esse rojão

Meu caro amigo eu não pretendo provocar
Nem atiçar suas saudades
Mas acontece que não posso me furtar
A lhe contar as novidades
Aqui na terra 'tão jogando futebol
Tem muito samba, muito choro e rock'n'roll
Uns dias chove, noutros dias bate sol
Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta
É pirueta pra cavar o ganha-pão
Que a gente vai cavando só de birra, só de sarro
E a gente vai fumando que, também, sem cigarro
Ninguém segura esse rojão

Meu caro amigo eu quis até telefonar
Mas a tarifa não tem graça
Eu ando aflito pra fazer você ficar
A par de tudo que se passa
Aqui na terra 'tão jogando futebol
Tem muito samba, muito choro e rock'n'roll
Uns dias chove, noutros dias bate sol
Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta
Muita careta pra engolir a transação
E a gente tá engolindo cada sapo no caminho
E a gente vai se amando que, também, sem um carinho
Ninguém segura esse rojão

Meu caro amigo eu bem queria lhe escrever
Mas o correio andou arisco
Se permitem, vou tentar lhe remeter
Notícias frescas nesse disco
Aqui na terra 'tão jogando futebol
Tem muito samba, muito choro e rock'n'roll
Uns dias chove, noutros dias bate sol
Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta
A Marieta manda um beijo para os seus
Um beijo na família, na Cecília e nas crianças
O Francis aproveita pra também mandar lembranças
A todo o pessoal
Adeus

Francis Hime - Chico Buarque
1976

segunda-feira, novembro 10, 2003

And the Oscar goes to ...

Admitindo que uma opiniao individual transporta sempre consigo uma carga subjectiva, ainda assim, e porque a liberdade consiste em fazer opcoes e nao alienar essas mesmas opcoes, o filme que esteve em exibicao neste fim de semana no Cine Estudio 222, "Requiem for a Dream", do realizador norte-americano Darren Aronofsky, ocupa desde ja nas minhas preferencias o lugar cimeiro no que diz respeito a melhor pelicula cinematografica vista durante ano de 2003.
Este e um filme que acompanha a perseguicao dos sonhos de felicidade ao longo de tres estacoes (Verao, Outono e Inverno), por parte de quatro personagens. As personagens sao Sally, uma viuva solitaria e avida de aparecer na televisao para colmatar a carencia de reconhecimento e afectos, Harry, o filho, heroimano, o seu amigoTy, seu parceiro de negocios e acompanhante de viagens ao limbo da existencia, e Marrion, namorada de Harry, aspirante a pequena empresaria no sector do vestuario, e desiludida com a "ausencia" constante dos progenitores na sua vida.
No inicio, durante o Verao, o jubilo e a esperanca assolam o estado emocional das personagens. Com a chegada do Outono, estes sentimentos transformam-se em tormenta e desassossego. Por fim, eis o Inverno, e com ele os sonhos primordiais cedem lugar ao pesadelo e a escuridao absoluta.
Todo este percurso retrata o mergulho colectivo no abismo das drogas (nao apenas a heroina, mas a TV ou os comprimidos para emagrecer), por personagens que anseiam pelo usufruto de sentimentos feericos mas que acabam consumidos pela Dependencia.
Mas nao se pense que o realizador aponta o dedo as personagens e se compraz na decadencia e na humilhacao delas perante a situacao tragica e inane dos seus destinos. Pelo contrario, no final, Aronofsky, ao libertar as personagens da Dependencia, atraves da "extincao" dos mesmos, redime-os e resgata-os do martirio que atravessavam, provocado pela ilusao compartilhada dos beneficios das drogas e da fuga ao "real".
No meio de tudo isto, ao longo de todo o filme, sucedem-se a um ritmo vertiginoso os cortes de imagens e sons, entrelacados por grandes planos e ecrans divididos numa miriade de sequencias freneticas que servem de metafora a rapidez com que a Dependencia se alastra e ao precipicio para o qual ela conduz os seus fantoches.

sexta-feira, novembro 07, 2003

Sugestão para o fim de semana de S. Martinho

Castanhas de Chocolate à Moda de Viseu

Ingredientes

300 g de castanhas cozidas ;
1 requeijão ;
2 colheres de sopa de coco ralado ;
2 colheres de sopa de açúcar ;
3 colheres de sopa de castanha assada e ralada ;
1,5 colher de natas ;
200 g de chocolate em barra ;
75 g de manteiga
Confecção:

Passe pelo passe-vite as castanhas cozidas e o requeijão. Junte ao puré obtido o açúcar, as natas e o coco. Junte o chocolate, previamente derretido em banho-maria, e a castanha ralada. Misture muito bem. Tenda as pequenas bolas em forma de castanha. Passe-as por açúcar pilé e coloque-as em caixinhas de papel frisado.

Bom Apetite

quinta-feira, novembro 06, 2003

Do Sr. José Manuel Gouveia

O Sr. José Manuel Gouveia enviou um e-mail para o endereço electrónico do Grupo do Pato, que passaria a transcrever, para aqueles que não tiveram conhecimento.
Antes ainda, gostaria de agradecer, penso que de forma extensível aos outros membros, ao Sr. José Manuel as considerações elogiosas que teceu acerca deste Blog.

"Chamo-me José Manuel Gouveia e gostava de saudar o vosso espaço de intervenção. Gosto especialmente das discussões que têm e do rumo proletário que se vê nalgumas pessoas . É preciso gente com força porque as coisas estão difíceis. Sou reformado da Lisnave onde tive que aprender nos últimos anos a mexer nos computadores porque tive um problema no braço e os gajos não me quiseram reformar logo ali, e tive que me habituar ao escritório. O meu filho é que tem um desses blogues com os amigos sobre música da pesada, desses que andam todos de preto e eu, para ver os disparates que eles escreviam comecei a ler, ele deu-me a morada e agora ando sempre ai a ver os blogues, já que não tenho mais nada para fazer. É um dos melhores o vosso blogue porque fala dos problemas das pessoas sem grandes complicações como outros que aindam prá aí e que não se percebem nada, por isso é que gostei daquela resposta do amigo global aquele outro leitor. Até me lembrou lá um tipo da fabrica que era um gozo , ninguém se metia com ele, o gajo até era meio educado, tirou não sei lá bem o quê, até pensei que podia ser ele mas a última vez que soube dele estava em Angola num negócio qualquer. Mas esse tipo o global já deve ter sido operário, tem tomates e é isso que é preciso porque só aqueles que passaram por elas é que sabem e não esses gajos que tem blogues e que são uns intelectuais, desculpem lá mas de merda. Gosto também das conversas sobre a bola, porque é isso que nos vai distraindo, fala-se pouco de bola nos blogues. Continuem, força".

quarta-feira, novembro 05, 2003

Notícia preocupante

As ligações no âmbito do projecto "Internet nas escolas" vão deixar de ser pagas pela Fundação para a Computação Cientifica Nacional (FCCN), entidade que gere a Rede Ciência, Tecnologia e Sociedade (RCTS), que permite as ligações à Internet nas escolas, nos espaços internet e ainda as de diversas instituições de solidariedade social.
A FCCN gere as ligações através do POSI (Programa Operacional para a Sociedade da Informação), mas como este financiamento termina no final do corrente ano, a fundação deixa de ter condições para continuar a assumir estas ligações, pelo que terão que ser suportadas através do Orçamento do Estado.
Para já, as escolas começaram a receber a comunicação por parte da FCCN de que irá cancelar as ligações no final do ano...
Lançado em 1996, o Programa "Internet na Escola", do Ministério da Ciência e da Tecnologia, estava enquadrado nas iniciativas do Governo no âmbito da chamada Sociedade da Informação. Numa primeira fase foram contempladas as escolas do 5º ao 12º ano de escolaridade, através da instalação de um computador multimédia e respectiva ligação à Internet.
Face a este panorama sombrio que se depara à continuação deste projecto fulcral para a democratização e para a equalização dos desníveis sociais no acesso à Internet, quero acreditar que realmente o Orçamento de Estado, venha a consagrar uma dotação orçamental capaz de dar prossecução ao cumprimento desta medida.
Acaso tal não suceda, desfere-se um rude golpe no sentido positivo da correcção das desigualdades sociais domésticas no acesso à Internet (e que são tão acentuadas), por parte dos estudantes portugueses.
Vou esperar para ver se as pretensões de justiça social deste Governo vão chegar à Internet...

segunda-feira, novembro 03, 2003

Sobre a Rússia

Na sequência dos acontecimentos que se têm vindo a precipitar nos últimos dias, o milionário russo Mikhail Khodorkovski, presidente da empresa petrolífera Iukos, demitiu-se hoje do cargo, após dez dias de detenção por suspeitas de fraude generalizada e evasão fiscal.
Na sequência, Alexander Voloshin, chefe da administração presidencial, a terceira posição mais importante na hierarquia do Estado russo, e um simpatizante de Khodorkovski, apresentou a demissão na sequência da detenção do magnata.
Estas acções judiciais que assinalam o conflito declarado entre o Kremlin e os magnatas russos, alguns deles, como Voloshin, com manifestos poderes políticos, parecem-me radicar em dois pólos distintos, por parte do Kremlin.
Num primeiro pólo, da parte dos partidários de Putin, a intenção de secar a emergência de partidos políticos financiados pelos magnatas, capazes de irem para a peleja nas eleições que se aproximam.
Num segundo pólo, com menos importância no móbil das acções desencadeadas, mas ainda assim credor de interesse, designando os prosélitos de Putin maioritariamente indivíduos que pertenciam aos antigos serviços secretos soviéticos, confrontam-se neste episódio russo actual, também as duas clássicas concepções de organização social: os defensores do intervencionismo estatal, nomeadamente nos assuntos económicos, e os defensores do liberalismo económico, dominantes no espaço económico russo após as privatizações selváticas da ex-União Soviética.
Apesar de crer que o peso dominante no confronto, indiscutivelmente, está a ser determinado pela medição de forças entre dois grupos que partilham pretensões similares relativamente ao controlo governativo, ainda assim parece-me que esta refrega não deixa de estar também infiltrada por alguns resquícios ideológicos, trazendo à recordação velhos episódios da luta pelo poder na Rússia.

sábado, novembro 01, 2003

Sobre os discursos: resposta ao Marçal

É verdade que o significado das palavras não depende apenas de uma conjugação de signos. A interpretação de uma frase deve avaliar o tom utilizado pelo emissor, as pausas, a expressão facial, etc. Estes dados podem transformar uma afirmação, enfatizar uma ideia ou, noutro sentido, estabelecer formas de relativização do que foi dito. Numa frase escrita não posso, em princípio, interpretar os tons, os sorrisos ou a expressão facial de quem a escreveu (a menos que o escritor nos forneça essa informação). Deste modo, para interpretar um texto, tenho que me quedar pelo que está redigido. No universo da escrita existem formas de transformar ou relativizar o que foi dito: a própria construção das frases, o humor, algumas formas de ironia, etc. Isto tudo para dizer que, se fui injusto na apreciação de certos textos de alguns companheiros, isso deve-se apenas ao facto de, na minha leitura desses textos, não ter encontrado qualquer mecanismo que permitisse distinguir “uma coisa que é para rir um bocado”, “mandar umas bocas uns aos outros” e que “não deve ser levada minimamente a sério”, de formulações categóricas escritas num estilo igual, sem tirar nem pôr, ao utilizado para falar e discutir outros assuntos. O que me preocupa não são os jogos jocosos de crítica saudável, na fronteira da irracionalidade, que adeptos de clubes diferentes desenvolvem entre si. Não fui eu o atingido pela crítica ao Benfica. Eu posso defender-me. Preocupa-me, isso sim, por um lado, as omissões, e por outro, algumas concepções que se vislumbram por detrás da crítica futebolística. Sobre as omissões, basta dizer que culpar um clube de futebol por todo o tipo de aproveitamentos políticos e económicos é de um sentido analítico extraordinário. Sobre as concepções que sustentam certas análises o caso é talvez mais grave (e é por isso que as coisas são sérias meu caro Marçal, se ao menos houvesse algum distanciamento). É sabido que a pertença a um clube de futebol tem, para muitas pessoas, um significado quotidiano importante, seja no seio familiar, seja no trabalho ou no tempo de lazer. No contexto português o Benfica é indiscutivelmente o clube mais popular. A crítica feita ao Benfica neste blog insistiu várias vezes nesta relação do Benfica, “o clube mais português de Portugal”, com o povo. As analogias e os adjectivos são quase sempre bastante infelizes e lamentáveis.
Quanto à questão da vinda do presidente do presidente do governo regional da Madeira à inauguração do Estádio porventura terei sido injusto, dado que não foi o único populista presente. Realmente deviam todos levar a sua bicada. Mea-culpa. Felizmente que o povo tonto do Benfica sob responder à altura, não por ser do Benfica, mas por sofrer aquilo que a grande parte dos portugueses sofre no dia-a-dia.

sexta-feira, outubro 31, 2003

Sobre a bola...

Sempre fez-me muita confusão, muito antes da minha incursão pelos meandros da Sociologia, o fanatismo, de toda e qualquer espécie.
Lamentavelmente, ou talvez não, nunca encontrei uma facção, ou grupo, com a qual me identificasse completamente. E sempre achei redutor (apesar de inevitável) ter de optar por uma facção ou, pior ainda, ter um sentimento “determinista” de pertença a uma “tribo” por herança. Claro que é muito mais confortável ter as opções já todas feitas à nascença, o método de “recrutamento” que as Religiões apuraram em milénios de existência, mas acho muito mais “vida” (apesar de muito mais difícil) os indivíduos terem a possibilidade e a responsabilidade de fazerem as suas escolhas.
No futebol, apesar de ainda ter resistido uns anos, tive de fazer uma opção relativamente cedo. A pressão foi demasiada. A certa altura, lá pelo início do secundário, vinha a pergunta inevitável: “Então, qual é o teu clube?” Lá estava eu com um enorme problema... Eu até gostava de “jogar à bola”, mas não tinha um clube, não tinha pachorra para ver jogos de futebol, e entre uma colecção de cromos de jogadores de bola e outra sobre a Exploração Espacial nem tinha dúvidas, optava pela última...
E neste juvenil limbo identitário andava eu, a ser olhado cada vez mais de lado pelos colegas de escola. Era “o gajo esquisito que não tinha clube de futebol”, e isto no melhor dos epítetos...
Até o dia em que resolvi o assunto optando pelo Sporting. Motivo: era o único clube do qual eu tinha uma t-shirt (oferta de um primo mais velho que era dirigente do Sporting Club Madeira). Passei a dizer que era do Sporting. Uma escolha muito racional...
Até que comecei a achar piada a esta coisa de ser sportinguista. Anos e anos seguidos sem ver uma vitória e um gajo ia rindo e dizia: “Pois, isto de ser sportinguista...”
O que eu gostava do Sporting era esta característica de perder campeonatos mas não perder a compostura. Meteu-se-me na cabeça que o Sporting era um clube de cavalheiros. E até acho que o Sporting teve o melhor presidente de um clube de futebol em Portugal nos últimos anos, o Roquette, que era um cavalheiro com visão. Mas, por outro lado, o Sporting também teve, na sua equipa, alguns dos maiores energúmenos que já vi no futebol: o João Pinto e o Sá Pinto ( ambos Pintos, como eu... Hum!??)
Pela primeira razão continuo a simpatizar com o Sporting. Mas, pela segunda razão (que se repete em todos os outros clubes, uma completa falta de desportivismo e de civismo ao que se junta o fenómeno claques, os presidentes “empreiteiros patos bravos” e o descarado aproveitamento político que se faz da coisa, etc.), não me importava nada que fizessem explodir o novo estádio do Sporting e todos os outros juntamente.
Só ficavam os campos de futebol para a malta ir jogar ao fim-de-semana e para os putos passarem as tardes entretidos. Acabava com o futebol profissional em dois tempos. E acho que ninguém ia perder nada. Mesmo os que muito gostam de ir passar tardes num estádio a apanhar banhos de multidão (coisa que se consegue muito bem fazer viajando de Metro e que é cada vez mais raro acontecer nos estádios...).
Acho que o futebol, tal como está, só dá para gozar e rir um bocado. Ir mandando umas bocas para os amigos, mas nunca e jamais para ser levado minimamente a sério...
É por isso que este último post do Nuno deixou-me um pouco chocado... E não acredito que alguém do Pato perca tempo a “ter ódio pelo Benfica.”
Como também duvido muito que alguém da tenha ido a Lisboa beijar a mão a um vendedor de pneus... A não ser que um independentista tivesse tido o azar de ter simultaneamente dois pneus furados às 4 da manhã a meio de Monsanto... Acho que qualquer um beijava a mão ao vendedor de pneus que o tirasse da embrulhada.
Fica a promessa de, quando me for possível, ou achar que tenho alguma coisa a acrescentar, falar sobre "a desertificação do interior, dos múltiplos despedimentos que assolam a Beira Baixa, das fábricas que fecham, das escolas que fecham", entre outros. Isto se conseguir ultrapassar o trauma do jornalista....

quinta-feira, outubro 30, 2003

Sobre o ódio

Sobre o ódio.

O caso está a tornar-se, do ponto de vista medicinal da questão, patético e preocupante. Quando falo sobre a bola, ultrapasso muitas vezes os limites da minha racionalidade, mas faço-o quase sempre conscientemente. Receio, porém, que o mesmo não se passe em relação a alguns dos meus companheiros de blog, O ódio que sentem pelo Benfica parece tão real e vincado que, de repente, parece ter-se tornado o seu objectivo de vida violentar tudo o que se relacione com o clube da águia. Como sou simpatizante desta agremiação devo dizer que me sinto também violentado. Só sou do Benfica porque o meu avô me levava ao estádio, não pertenço a nenhum bando de malfeitores. O raciocínio dos meus companheiros é tão primário, tão ressabiado e tão ressentido que temo percam a razão, instrumento tão importante para analisar outros problemas do mundo. São 22 jogadores atrás de uma bola. Se quiserem criticar as relações do futebol com a política, a economia e os media, não culpem os mais fracos, dirigam-se aos políticos, às empresas, e às televisões etc. Meus amigos, não têm mais nada para fazer na vida do que ver os jogos do Benfica, a inauguração do estádio do Benfica, as notícias de jornal sobre o Benfica, os programas de rádio sobre o Benfica, e escrever textos sobre o Benfica. Ao menos o Hugo fala de Top-models. Vocês também se podiam distrair com outras coisas. A energia que gastam com o Benfica (um verdadeiro saco de boxe freudiano) podiam-na utilizar de forma mais útil. Sei lá, eu sei que isto ao pé do Benfica não interessa nada, mas podiam falar da desertificação do interior, dos múltiplos despedimentos que assolam a Beira Baixa, das fábricas que fecham, das escolas que fecham. Bem sei que são coisas menores ao pé do Benfica, mas era só para variar um bocadinho. Por exemplo, para falar de impostos não é preciso chatear o Benfica, mas talvez apontar o dedo a certos dirigentes regionais, que andam sempre com a independência de baixo da língua, mas depois, provincianamente, vêm a Lisboa beijar a mão do rei dos pneus. E depois a culpa é do Benfica.

quarta-feira, outubro 29, 2003

Finalmente ouvi a ex-Top model

Visualmente a capa do CD e apelativa, uma "jovem" tendo por respaldo o chao, ladeada por uma guitarra.
Insito no topo do CD, surpreendentemente, o nome da artista que o encabeca traz a memoria tempos nao muito distantes dos desfiles parisienses (confesso que era a minha Top-model favorita...). Depois de uma hesitacao inicial, lá decidi avancar para a auscultacao do disco.
Logo nas primeiras faixas e audivel que as composicoes sao marcadas, instrumentalmente, por um acentuado despojamento em termos de arranjos, onde reina a acustica. Tinha lido numa entrevista que esta tinha sido uma opcao pessoal da cantora, decorrente de gostos pessoais (Leonard Cohen, Bob Dylan, Bjork ou Jacques Brel). Legitima como qualquer outra.
Com o avanco da audicao do disco mais notoria se torna a presenca de uma linha condutora simples e melodica, sustentada pela língua francesa, que neste caso se casa perfeitamente com a intencao expressiva da cantora.
No fim, em genero de balanco, fica um album que revela a estreia elegante e intimista de uma ex-Top-model.
Carla Bruni, Quelqu´un m´a dit

terça-feira, outubro 28, 2003

ENTREVISTA DO PRESIDENTE

O Presidente da República deu uma boa entrevista à RTP, hoje transcrita no jornal Público. Da generalidade das suas intervenções saliente-se a sensatez no modo como encarou o excessivamente mediático processo da Casa Pia, a preocupação demonstrada com o cenário de desinvestimento global no ensino e a crítica à progressiva comercialização do sistema nacional de saúde. Mas mais importante do que estas questões foi a sua inteligente análise macroeconómica. Sampaio mostrou-se apreensivo em relação a uma política orçamental que insiste em conter o investimento público (sobretudo em sectores como a educação, a saúde e o do investimento tecnológico), mas que não consegue promover o aumento das receitas do Estado. O equilíbrio orçamental é sempre conseguido à custa de receitas extraordinárias, muitas delas resultantes da venda de património público. Neste contexto, o governo, ao contrário do prometido, continua a ser permissivo no que respeita à evasão fiscal. O quadro desenhado aponta, a toda a velocidade, para um crescendo das desigualdades sociais.
A presidência de Sampaio é passível de ser criticada em inúmeros aspectos. No entanto, olhando para os candidatos à sua sucessão, facilmente percebemos que vai demorar tempo a encontrar um presidente ao nível do que temos hoje.

Cristo!

Até fiquei com pena do Arnaldinho... Coitado.

segunda-feira, outubro 27, 2003

Anedotazzzz2

A mulher para o marido:
- Por que é que não usas a aliança de casamento ?
- Estás doida ? Com este calor ?

Anedotazzz

P: Como se chama a mulher que nunca se afoga e sempre que pode aparece nos telhados?
R: A Clarabóia...

Dos Subúrbios

Não há nada como vir um gajo dos subúrbios, que detesta assuntos chatos e sérios, falar do "distanciamento brechtiano" e do "efeito Kuletchov" ...

Clandestino

Fui descoberto. Porra!

Chatos do caralho

Recebi um e-mail que passo a publicar, dado o seu conteúdo interessar a todos. “Há quase um ano que sou um assíduo frequentador da blogosfera. Das centenas de blogs que já visitei, garanto-vos que não encontrei nada mais aborrecido que o vosso. A falta de sofisticação é épica, a seriedade anacrónica. São uns chatos. Os vossos assuntos preferidos são os orçamentos de Estado, a política do governo, futebol, o Partido Socialista, o papa e o Tocqueville. O tal do Nuno, em apenas um mês, já utilizou a expressão classes sociais mais vezes do que toda a blogosfera durante um ano. Lidera também as entradas para burguesia, operariado, os dominados e os dominantes. Mais enfadonho que o Nuno só mesmo o Bruno. Além de falar das mesmas coisas aborrecidas e insuportavelmente sérias é de direita e faz odes ao João Paulo II. Nem uma referenciazinha a Buda, nem ao Confúcio, nem mesmo ao Lao-Tzu, foda-se, pelo menos o Lao-Tzu. Depois há um tal de Palouro. Tive esperança que fosse do Bloco de Esquerda, mas não. Uma apreciação ao seu vocabulário revela que ainda não utilizou as palavras , “enrola-me ai um”, “enrola-me ai outro”, “enrola-me lá essa merda”, “enrola-te lá”, “enrola-te lá e enrola-mo cá”, “enrola-me lá e traz um amigo também”, “enrola-te cá e venham mais cinco”. Temos ainda o Stuart, que eu desconfio, sinceramente, que seja um pseudónimo do Guilherme Leite, e o Olson, que tem pinta de função pública (não há nada menos sofisticado do que a função pública), sempre a queixar-se, incapaz de um rasgo intelectual, género “distanciamento brechtiano”, ou “efeito Kuletchov”. Consta ainda do grupo um tal de César Mogueime, que além de ter o nome mais ridículo da blogosfera, é uma espécie de Baptista Bastos do grupo, «num bar da Funchal lá entrou o meu primo Isaías com o castor debaixo do braço». Uma seca. Sobram os esporádicos, todos igualmente chatos. Em suma, deixei os Lexotans, os Lorenins, os Xanax e as folhas de alfaces, dois minutos no Blog do grupo do Pato e estou ferrado. Apesar de tudo, obrigado.
Arnaldo J. / Paço D’Arcos

domingo, outubro 26, 2003

Verdes de inveja

É lindo, lindo, lindo e lindo. Nada mais a acrescentar.

A lata destes gajos. Julgava eu que o clube dos betinhos iria ter o bom gosto de contratar alguém que fizesse outra coisa do seu estádio que não uma casa de banho gigante com azulejos em que a combinação de cores atinge o zénite do mau gosto. Pois estava enganado. Definitivamente já não se fazem betinhos como antigamente. Antes uma catedral do que um monumento aos lavabos pós-modernos.

De assinalar. Deve-se ao Benfica, ou melhor aos seus adeptos, uma das mais mediáticas afrontas à política deste governo. Noutros locais há pouco inaugurados não ouvi nada. Alguém ouviu alguma coisa?

Para terminar, dizer que ontem, na nova Luz, não se ouviu um único cântico ou palavra de ordem contra qualquer outro clube rival. É assim na Catedral.

Depois há as outras coisas más, mas isso agora não interessa nada.

É lindo, lindo e lindo, e se não fosse lindo era pelo menos o maior. Há algum maior por ai? Alguém viu um maior? Bem me parecia que não.

sexta-feira, outubro 24, 2003

Cunhas

Gostava de pedir ao Bruno que colocasse dois novos blogues na nossa lista aqui do lado direito. Refiro-me ao pontoevírgula e à Voz no Deserto. Cumprimentos à Margarida e ao Tiago. São cunhas, mas valem a pena. Fica a sugestão.

Consciência de classe

Um dos operários que está a fazer obras lá no meu prédio tocou-me à porta porque precisava de fazer uns acabamentos. Lá andou a pôr massa nuns buracos e a certa altura pediu-me um folha de jornal para ajudar a limpar a massa que sobejava. Abri a Bola de terça-feira e dei-lhe uma folha. O homem olhou para a página e disse que aquela não servia. Era uma das páginas sobre o Benfica. Perguntei-lhe se tinha preferência por outro assunto qualquer. Disse-me que desde que não fosse a do Benfica era indiferente. Dei-lhe uma ao acaso. É isto que nos distingue do resto da maralha, somos pelo Benfica e não contra os outros simpáticos clubes, de quem, no fundo, até gostamos. Já agora, em resposta à pergunta do lagarto, há poucas a ver o Benfica no Estádio porque o clube é de trabalhadores. Se as nossas elites não fazem nada pelo país alguém tem que o fazer. Mas agora com a nova catedral isto vai mudar. Viva o Benfica.

Miséria

Na Assembleia da República discute-se hoje o estado das políticas sociais do país. Como se esperava, o programa do governo, escrupulosamente seguido em relação ao défice público, não vai ser cumprido em vários aspectos fundamentais. Portugal continua a ser um país absolutamente miserável ao nível das políticas sociais. A ajuda do Dr. Portas aos velhinhos, que seria concretizada pela convergência da pensão mínima com o salário mínimo, não passou, como era esperado, de populismo barato. Noutro âmbito, é preciso reagir com dinâmica à ideia peregrina de que o sistema de segurança social está à beira do colapso. É falso. Só aqueles que desejam lucrar com a sua privatização conseguem sustentar esta ideia. Uma política realmente comprometida com a vontade de ajudar os mais fracos faz-se com medidas concertas e não com retóricas inconsequentes (é por isto, aliás, que o senhor Wojtyla é um reaccionário do pior, porque o seu lado pretensamente bom é simples retórica, ao passo que o lado tenebroso tem, infelizmente, consequências práticas. Apresentem-me um exemplo, só peço um, de uma actuação concreta do Vaticano para minorar as grandes injustiças do capitalismo, para evitar guerras que violam o direito internacional, para ajudar, e não falo da caridadezinha, as pessoas que sofrem com as cada vez mais intensas desigualdades sociais. Bem prega Frei Tomás).

O exemplo

No meio do trânsito, estão, lado a lado, um Mercedes com uma madame finíssima e um Fiat Uno bem velhinho, onde vai o Zé dos bigodes.
O Zé grita, buzina, faz um escarcéu por causa do trânsito ... até que, a fina madame baixa o vidro e diz-lhe:
- Oh meu senhor, "A paciência é a mais nobre e gentil
das virtudes!", Shakespeare, em "Macbeth".
O tipo do Uno não se intimida e revida:
- "Tou-me cagando pra essa merda!", Ferro Rodrigues, em "Processo da
Casa Pia".

quinta-feira, outubro 23, 2003

quarta-feira, outubro 22, 2003

Montalbán

Algures num aeroporto de Banguecoque um escritor de livros policiais morreu. O caso parece não merecer a investigação de um detective privado. Ataque cardíaco. E pronto, as aventuras de Pepe Carvalho, o gastrónomo galego de Barcelona, ex-comunista, ex-agente da CIA, vão viver em círculo nas obras publicadas. Muitos livros da Biblioteca de Carvalho ficaram por queimar.
“Às vezes penso voltar a Paris. Tenho um armário cheio de fatos em casa da minha mãe. Tenho a minha ex-mulher casada com um catedrático riquíssimo a quem assenta muito bem o fraque e que está constantemente a aparecer nos Jours de France. Se me deitar a recapitular os meus livros e me puser a ler o Le Monde Diplomatique destes últimos sete ou oito anos, ficarei em dia e tenho a certeza de encontrar um bom emprego, se fizer cara de filho pródigo e lhes vender que venho do universo do marxismo e da contracultura, consciente de que a única verdade detêm-na Milton Friedman e o neo-liberalismo económico e político. A hegemonia da burguesia sustenta-se graças à prestação de método e linguagem que lhe trouxeram os dissidentes do inimigo e os meninos que foram marxistas ou budistas ou drogados e depois voltaram para casa do papá.”

Manuel Vásquez Montalbán, Os Pássaros de Banguecoque, Lisboa, Caminho, p.214

segunda-feira, outubro 20, 2003

A Última Semana da Bola

Do mosaico futebolístico da última semana, gostaria de afixar alguns comentários. Da campanha eleitoral do Benfica, que tantos momentos de boa disposição nos tem dado, tivemos no sábado Guerra Madaleno a anunciar que a contratação de Beckham estaria ao alcance da sua candidatura, acaso ganhasse as eleições! Desde já posso garantir a veracidade desta notícia! E mais, para além de Beckham, também o restante plantel do Real Madrid já manifestou vontade de mudar de capital, desde que os jogadores ouviram Luís Filipe Vieira a anunciar que o Benfica será o maior clube da Europa daqui a 3 anos!
Quanto ao Sporting, é chegado o momento de esclarecer de uma vez por todas o mistério das seringas na Suécia! Segundo informações obtidas por fontes crediveis, as seringas não continham mais do que uma substância que estava a ser testada secretamente há algumas semanas no laboratório químico da Academia de Alcochete, e que visava combater a fobia dos golos sofridos no último minuto pelo clube! Depois de muitas experiências durante os últimos dias, provou-se na Suécia que a substância encontrada para já demonstra ser eficaz.
Entretanto posso dizer em primeira mão que está já a ser pesquisada nos laboratórios uma nova substância, cujo objectivo é ajudar os responsáveis e os jogadores do clube a pronunciarem correctamente o nome do clube turco que saiu na rifa ao Sporting na próxima eliminatória da Taça Uefa, o Gencleciblidebialiniremihineci...
Ainda no Sporting tivemos o vice Soares Franco da Linha a dizer que o Papa estava a morrer. Enfim, nada que nos espante, pois o namoro deste com uma jovem nortenha de 27 anos logo fazia prever que o Papa iria sofrer um desgaste acentuado para satisfazer os apetites da jovem. Exaurido por sucessivas maratonas sexuais com a jovem e por combates de luta livre com a ex-esposa, parece então que o Papa está agora a dar as últimas...
Por fim, na Selecção Nacional, Scolari voltou a reiterar que não irá convocar Baía para o Euro 2004, acrescentando até que mais depressa convocava o guarda redes do Chelsea, perdão Chelski, após tê-lo visto a jogar este fim de semana contra o Arsenal, do que Baía!

quinta-feira, outubro 16, 2003

o papa

Vive-se uma espécie de histeria papal. Confesso que não percebo porquê. Encontram-se entre os mais entusiásticos aqueles que, há muito pouco tempo, perante a posição anti-guerra do papa, afirmaram que o senhor não podia dizer outra coisa; a sua opinião era salutar, humana no fundo, mas o assunto era sério e, assim, valores mais altos se levantam. E pensava eu que acima do papa só o outro, vocês sabem quem. Este papa, dentro do género, foi bastante mau. É certo que não mandou ninguém para a fogueira, não colaborou com nazis e até pediu desculpa ao Galileu, embora com ligeiro atraso. De resto foi mau. Atribuem-lhe o facto de ter esmagado o comunismo soviético, mas este esmagou-se a si mesmo. No que respeita ao modo como julgou a vidas das pessoas foi de um fundamentalismo extraordinário. As suas posições em relação aos métodos contraceptivos, ao aborto, ao divórcio, aos homossexuais são quase medievais. Mais grave, porém, talvez seja o modo como as mulheres continuam a ser tratadas no interior da igreja católica. Claro que por detrás da moral e dos bons costumes estão, como dizem os católicos oportunistas que apoiaram a guerra, os assuntos sérios: as negociatas da opus dei, os interesses financeiros, as infiltrações nos meandros do poder político, académico, judicial, etc. Respeito os poucos católicos que seguem os bons ensinamentos do livro, com certeza que são cidadãos quase exemplares. Não acho que a Igreja seja um todo uniforme. Como em todo o lado há pessoas que pensam de forma diferente e que têm uma postura progressista e humana. No geral, porém, a hierarquia reflecte quase sempre um conservadorismo perverso.

quarta-feira, outubro 15, 2003

Picanha

Era uma vez uma pequena cidade do interior de Portugal onde todos eram felizes e trabalhadores. As famílias, abençoadas pela santa madre igreja, eram o esteio da comunidade para o sucesso da qual contribuíam homens rudes mas honestos e mulheres dóceis e dedicadas. As crianças viviam contentes nas suas pequenas e ingénuas brincadeiras esperando um dia seguir o exemplo abnegado das mães e a postura forte e determinada dos pais. Tudo corria pelo melhor no desertificado interior português, quando o terrível feiticeiro do reino de Krom enviou trezentas prostitutas brasileiras para destruir a felicidade da pacata comunidade. E logo brasileiras, das piores como se sabe. De um momento para o outro, enfiteiçados pelo canto enebriante das meretrizes, os valorosos homens da cidade enlouqueceram. Tornaram-se trabalhadores desleixados, romperam com os bonitos hábitos familiares e quiseram mudar o nome dos filhos para Gerson, Juninho, Wanderley Alexandre, Jumira, Losiney e afins. As mulheres desesperaram para o contentamento de bruxas, cartomantes, tarólogas, psicólogas e da TVI. Felizmente que alguém, perante a normal apatia da comunidade internacional, resolveu actuar. George Bush, o presidente de todos os humanos tomou o caso em mãos, colocando a Time, esse pilar da democracia mediática, em acção. A sua táctica é surpreendente. Bush quer mandar as brasileiras para Guantanamo e obrigar os homens da pequena cidade do interior português a assinarem esse baluarte da cultura americana que é Playboy Channel, apostando no faça você mesmo. Sempre à frente.
Por mim acho que a modernidade em Bragança começou pela cama. Viva o Brasil. Às mães de Bragança só posso lhes posso aconselhar a contratar uns gigolos ucranianos. Temos que construir o luso-tropicalismo-eslavo. Viva Portugal.

The New Red Light District

A aparição nos escaparates reais e virtuais da edição europeia da revista Time, trouxe de novo à primeira linha dos destaques noticiosos portugueses a situação daquelas que a revista Time designa por "meninas de Bragança".
Não sendo minha pretensão estar agora a discorrer sobre as razões do fenómeno, gostaria isso sim de utilizar esta pena de silício para deixar algumas palavras acerca da forma como as "meninas" foram apresentadas no noticiário da estação televisiva SIC.
Concretamente, e indo de modo directo ao sucedido, o jornal televisivo desta estação, ao fazer a introdução da notícia, afixou em pano de fundo no ecrã a capa da revista Time, ao que se seguiu de imediato o relato do pivôt do noticiário a anunciar que a revista trazia à sua primeira página uma fotografia onde se via claramente umas das "mulheres da má vida" ...
Fazendo letra morta da neutralidade semântica que deve pautar a informação objectiva e rigorosa, o pivôt deste jornal, ao descrever a pessoa, e todas as outras que partilham a mesma actividade profissional, como sendo elas "mulheres da má vida", logo extraiu uma raíz quadrada negativa dessas pessoas que infere a sua caracterização como promotoras do sumiço das virtudes morais da sociedade.
Porque o rigor jornalístico não se compadece com expressões de cariz popular ou com juízos particularísticos, melhor seria que quando olhassem para as pessoas da "boa vida", que se depreende, por antítese, serem aquelas que aparecem assiduamente nas "Caras" dos seus programas, se dessem conta do valor acrescentado que muitas dessas "mulheres da boa vida" trazem para o enriquecimento da qualidade moral da sociedade!

terça-feira, outubro 14, 2003

OE

De acordo com as primeiras previsoes vamos ter um proximo ano ainda com menos investimento na educacao, saude e seguranca social. Vamos ter mais investimento em carros para os director geral, secretaria e seguinte hierarquia. Ainda nao sei para que serve pagar impostos num pais que nao aposta em nada com uma visao de menos de 20 centimetros, nem consegue ver o outro lado da rua. Para a p....... dos estadios nao ha cortes. So ha cortes nas coisas que sao primordiais para um pais moderno.
A aposta era na ciencia e tecnologia. Onde esta?? Alguem viu. O Ze e a Maria ainda continuam a espera da operacao ou do filho ir para a faculdade, nao tem a sorte de outros. O outro filho esta em preventiva a 2 anos mas tem o azar te ter sido apanhado a roubar laranjas na propriedade do director da policia e como nao é pedofilo nao lhe ligam nenhuma. ETC, ETC.
Nao sei como se pode continuar a viver num pais assim.

Pensamento do dia


Aquele que, ao longo de todo o dia:

É activo como uma abelha,
Forte como um touro,
Trabalha que nem um cavalo,
E que ao fim da tarde se sente cansado que nem um cão.
Deveria consultar um veterinário.

É bem provável que seja um grande burro!

segunda-feira, outubro 13, 2003

Civilização

A Barbárie precede a queda da Civilização.

DOGVILLE

Desculpem o tamanho mas o nosso blogue não é um blogue light.
Lars Von Trier não é um cineasta que provoque unanimidades. Em relação à sua obra as opiniões quase sempre se dividem entre os que gostam muito e os que não gostam nada. Devo dizer que me encontro entre os primeiros. Independentemente das opiniões, Von Trier tem uma vantagem que vai rareando: os seus filmes provocam a discussão, não apenas a estritamente cinematográfica, mas a que remete para a forma como o realizador pensa e discute, o mundo e a vida. Dir-me-ão que estas duas dimensões, já que falamos de um filme, são inseparáveis, não podendo ser analisadas de per si. Certamente. Porém, por manifesta incapacidade de discutir convenientemente a primeira, gostava de cometer o lamentável sociologismo de me centrar na segunda, onde apesar de tudo, navego com maior facilidade. Têm os media salientado até à náusea, ideia para a qual o próprio Von Trier terá contribuído, que Dogville é sobre os Estados Unidos América. Na realidade, a acção do filme decorre numa pequena aldeia norte-americana, durante os difíceis anos da depressão que se seguiu à crise de 1929. A inserção histórica e espacial não encerra, porém, o significado da obra. Estou em crer que a sua moralidade, e Von Trier é um cineasta indiscutivelmente moralista, persegue uma dimensão universal. Claro que esta história moral vai-se adequando com maior ou menor exactidão às situações históricas em que vivemos. Nesse sentido, a crítica feroz inerente ao filme atinge com precisão o establishment da dominação geo-política quotidiana, que tem como centro o Estados Unidos da América.
Von Trier montou uma fábula, moral como todas as fábulas. A obra é uma montagem artística da sua tese. A pequena aldeia americana é o espaço desta demonstração. Von Trier assume isso. O filme é contado no terreno da fábula, os cenários são desenhados no chão, as casas não têm paredes, e o espaço remete obviamente para o teatro e para o exercício da encenação. A própria direcção de actores reenvia para uma dimensão teatral. Neste contexto «artificial», sobressaem as palavras que são ditas, a narrativa que é contada e, em último caso, a inevitável moralização da história. A fábula e o conto, embora géneros substancialmente diferentes, têm uma inspiração popular, no seio da qual a forma de contar está sempre ao serviço de uma moral, de algo que se quer demonstrar. Claro que a evolução do campo arte no caminho invío da autonomização sanciona este tipo de dispositivo que sacrifica a forma ao conteúdo, o mostrar ao demonstrar. A reviravolta formal, e ai Von Trier defende-se habilmente, surge pelo facto da construção da demonstração ser absolutamente original do ponto de vista cinematográfico, já que importa de outros materiais artístico o modo de contar. Von Trier é acusado de ser um manipulador, mas expõe de forma clara os mecanismos da sua manipulação. Nada está escondido. Trata-se de uma fábula. Resta aos seus detractores protestarem. Numa discussão, há formas diferentes de colocar as questões, mas se estas existem, proporcionam respostas. Von Trier quer discutir, mas não quer discutir apenas as formas cinematográficas, quer discutir a vida.
O filme de Von Trier é sobre a comunidade. A comunidade isolada. Uma aldeia pobre, algures nas Montanhas Rochosas, recebe a visita atribulada de uma estranha. Um esquema típico do cinema clássico americano: a harmonia do espaço vai ser quebrada pela nova personagem, está lançado o mote da narração. Grace, o nome da personagem interpretada por Nicole Kidman, foge de um grupo de gangsters. Um dilema assombra a comunidade de quinze indivíduos que habita Dogville: receber ou não receber Grace. Em nove capítulos e um prólogo, Von Trier, com a ajuda fundamental da narração de John Hurt, conta a história da relação de Grace com a comunidade. A recepção temerosa deu lugar à integração harmoniosa. Mas o constante assédio das forças policiais que entretanto procuravam Grace atormenta a comunidade. Aos poucos, esta vai exigir que Grace pague a sua protecção. O pagamento, inicialmente em horas de trabalho, vai extremar-se até à mais aberrante exploração sexual, uma situação conhecida e legitimada por toda a comunidade.
O modo como Von Trier trata os habitantes de Dogville é cruel, mas sobretudo ambíguo (já o olhar de Steinbeck sobre a América da depressão, em As Vinhas da Ira, expressava essa ambiguidade). É possível que a simpatia, que o humor e mesmo certa humanidade sejam compatíveis com o comprometimento individual num colectivo mecanicamente atroz? A caracterização bárbara de um conjunto de pessoas pobres e simples levanta evidentes problemas político-filosóficos. Choca, por exemplo, com a mitologia que a esquerda construiu sobre o povo, uma entidade intrinsecamente boa acossada por uma exploração milenar que evoluía e vários estádios. Por outro lado, rejeita a concepção oposta, típica da direita, que olha para as divisões entre os indivíduos como substâncias, “ele é assim porque é” ou, numa elaboração mais liberal, “ele está assim porque não teve o mérito de conseguir estar melhor”. A maldade, que aliás só consegue identificar como tal quem foi educado a interpretá-la dessa forma, é fruto da normalidade das circunstâncias particulares que rodeiam aqueles indivíduos. Só condena os habitantes de Dogville quem não compartilha a moralidade dos seus actos. A maldade, que pode conviver com os “bons sentimentos” faz parte de uma ética particular nascida das circunstâncias. Isto faz-nos regressar à ideia de comunidade. A transformação de uma sociedade tradicional numa sociedade moderna e industrial foi estudada por um conjunto de autores que são considerados hoje fundadores fundamentais do pensamento social. Tonnies falou da passagem de um estado “comunitário” a um estado “societal”, Weber da transição de uma sociedade caracterizada por “dominação tradicional” para uma sociedade onde vingava uma “dominação racional e burocrática”, Durkheim, por sua vez, falou da passagem de uma sociedade dominada por uma “solidariedade mecânica” para uma sociedade definida pela sua “solidariedade orgânica”. Marx, fora daquilo a que o marxismo veio a chamar de sociologia burguesa, antecipou, que à dissolução de uma ordem tradicional efectuada por uma burguesia revolucionária, se seguiria uma revolução proletária. Com evidentes diferenças entre estes autores, todos descrevem a destruição paulatina de uma sociedade tradicional, rural, isolada, comunitária e profundamente desigual por uma ordem moderna, burguesa, industrial e urbana onde o indivíduo se autonomizava das normas prevalecentes da tradição e do costume. Na cidade, espaço da mistura e da liberdade, o indivíduo ia enfrentar outra ordem não menos desigual; Sabemos quanto é perigoso fazer previsões em história. É pouco líquido que, mesmo nos países mais modernos e industrializados, certas lógicas decorrentes de um contexto tradicional tenham desaparecido. O tipo de circunstâncias sociais que enformam um contexto comunitário, rígido, pouco cosmopolita, não são monopólio de um tempo ou de um espaço. É por isto que penso que o filme de Von Trier não é sobre a América, mas acerca dos efeitos preversos de um totalitarismo comunitário que manieta um indivíduo que mecanicamente segue as regras da comunidade sem lhes conseguir responder. Eram assim os habitantes de Dogville. As normas de um colectivo que subjugava completamento o indivíduo, que se limitava a representar um papel definido pela comunidade, eram tão coercivas que ninguém ousou, perante as maiores iniquidades, pô-las em causa. A personagem de Tom, o filósofo, é a que mais se aproxima da ruptura mas acaba também por se tornar mais um cúmplice da tragédia. Será que este cenário traçado por Von Trier é assim tão irreal? Tão manipulador? Tão demagógico? Ou será que não é sob o beneplácito da comunidade mesquinha e isolada, tão típica, infelizmente, do Portugal atrasado do brandos costumes e dos chicos espertos, que decorrem um número incontável de pequenas atrocidades. É perante os olhos fechados da comunidade mesquinha e isolada que prospera a violência física e psicológica, sobre mulheres e as crianças, a justiça popular sobre as minorias, o caciquismo, o populismo. Tudo por detrás da aparência respeitável da comunidade. O que se passa por detrás das portas comenta-se. Mas não dá origem a qualquer intervenção. Intervir, mesmo sobre a mais intolerável acção, era romper com o equilíbrio da comunidade. Augusto M. Seabra (Público, 10/10), que considera Dogville o mais repelente filme que viu nos últimos anos, acha que Von Trier foi miserável quando, num travelling para trás mostra como toda a comunidade estava a ser conivente com a violação de Grace. O plano só choca Seabra porque a encenação de Von Trier retira as paredes das casas, as mesmas paredes que tornam publicamente respeitável a hipocrisia da comunidade. Conheci, no Portugal dos anos noventa, alguém a quem um filho de um cacique local, provavelmente embrigado, atropelara mortalmente um irmão de oito anos. O caso resolveu-se com 1000 contos. O dinheiro pagou o silêncio da mãe. A comunidade vendeu o silêncio por nada. Von Trier pode ser chamado de abjecto, pelo hipotético prazer exibicionista com que filma o rosário de Grace. Mas a sua fábula não é assim tão diferente da violência que José Saramago descreve no “Ensaio sobre a Cegueira”. Saramago, outro moralista.
Von Trier descreve circunstâncias, não culpa o indivíduo. A sua lógica relacional está povoada por questões intemporais, como as que decorrem do pensamento religioso. A religião sempre discutiu a condição humana, como o fez depois a filosofia e a arte. Grace, no epílogo do filme, afirma que se tivesse estado no lugar deles – dos habitantes de Dogville - tinha feito a mesma coisa, ou talvez pior. Basta pensarmos no nosso quotidiano para percebermos como esta frase se aplica a tantas situações. É “aquele lugar” que Von Trier critica.
Chegamos então ao final. As características perversas da comunidade de Von Trier não têm um local ou um tempo. Digamos que elas podem, dentro de certas circunstâncias, ser reproduzidas onde e quando quer que seja. A ideia de comunidade é, desta forma, transplantada do América da grande depressão, para outros contextos. O mesmo provincianismo, a mesma estreiteza de vista, a mesma falta de capacidade reflexiva e analítica podem fazer parte de comunidades urbanas e modernas. Aliás, o pessimismo de Max Weber em relação progressiva à racionalização do mundo, à hiper divisão social do trabalho, à autonomização de várias esferas do social, entre as quais a da arte, é bastante compatível com aquela visão. Os que destróem Dogville, matam de forma bem mais moderna e racional, sendo por isso bastante mais perigosos. Mas disso Von Trier falará, estou em crer, noutra ocasião.
E o que é que isto tudo tem a ver com os Estados Unidos da América? O país mais industrializado do mundo, o país mais poderoso e moderno elegeu um governo que decalca na perfeição a lógica de mesquinhez comunitária descrita por Von Trier. No seio da modernidade, nasce o mesmo anti-cosmopolitismo, a lógica maquiavelicamente dualista, a hipocrisia da comunidade que continua a pregar o respeitável, mas por detrás das paredes comete as atrocidades que acaba por legitimar colectivamente. O hiper-individualismo americano é um preconceito colectivo que justifica todo o tipo de iniquidades, reproduzindo as circunstâncias onde as pessoas simples se tornam monstruosas. Neste contexto, Von Trier assume-se, não apenas como um cineasta, mas como um crítico mordaz das sociedades contemporâneas, como aliás já o tinha feito em alguns dos seus filmes anteriores. A sua fábula moralmente demonstrativa é uma tese sobre o mundo. Os guardiões das formas não gostam, mas Von Trier não é apenas um jogador formal, é alguém que pensa o Homem. Não se trata apenas de discutir as formas da arte, mas as formas do Homem. Não se trata apenas de ver os pormenores mais recônditos da árvore, mas a imagem da floresta toda.

Do Dia do Mancebo

Daqui a uma semana comemora-se nesta ditosa pátria, com grande pompa e circunstância, o Dia da Defesa Nacional (acho que dia do Ataque Nacional para os mancebos sempre era mais apelativo, mas pronto...). Quis a "fortuna" que o mesmo esteja a ser organizado sob a batuta do Ministro do Zé e da Maria.
Infeliz por não ter tido ainda oportunidade de colocar todos os meninos e meninas deste país a cantar o Hino Nacional no início de cada dia escolar, o ministro do Zé e da Maria logo arranjou uma forma de abafar o seu desgosto.
Vai daí e pôs-se a convocar de forma compulsiva, sob pena de levarem umas vergastadas no rabo, dadas pelo próprio, todos os jovens mancebos deste país para a grande parada militar!
Posta de parte toda a parcimónia financeira que ao país é exigida pelos mais elevados dignatários das finanças, pois que as viagens e os comes e bebes são grátis, o ministro do Zé e da Maria, conhecido por desempenhar com frequência nas horas livres o papel de uma distinta actriz francesa, desfere mais um golpe de teatro na "modernidade" deste país através dos seus recalcamentos infantis, ao encenar uma daquelas exibições militaristas seguida por comício populista tão ao estilo da Velha Senhora.




O triste futuro das cadeiras amarelas

Há quase dez anos que passo parte da minha vida no número 26-c da Avenida de Berna. Parida de um antigo quartel, a Faculdade de Ciências Sociais e Humanas sempre foi um espaço estranho, difícil de perceber no seu conjunto. Durante quase três décadas foi um género de lego permanentemente remontado. Destrói de um lado, constrói do outro, quase sempre com aquela incompetência que nos habituámos a gostar. Em todo o caso, quem passe pela Av. De Berna dificilmente se apercebe que por detrás do famoso muro está uma parada militar preenchida pelo amarelo de uma esplanada que se exigia fosse classificada rapidamente pelos técnicos do IPAR. Já se sabe que a FCSH vai deixar a AV. De Berna. O destino não é a margem a sul como se pensava, mas os terrenos de Campolide, onde residem a Faculdade de Economia e Gestão e a novel Faculdade de Direito. Tive, esta semana, a oportunidade de passar pelas modernas instalações de Campolide. Não sou o Ernie Walker mas assim a olho não vejo que aquilo esteja preparado para nos receber. Todo o espaço é irritantemente moderno. O edifício da reitoria é um primor da regra e do esquadro, sem curvas, funcional, onde tudo está feito para ser eficiente. Uma chatice, de uma cor horrorosa; toda a gente tem um ar pálido, embora eficiente. Há urgências de hospitais mais divertidas. Dizer que a funcionalidade se deve aliar à estética é bonito, mas de que funcionalidade estamos a falar, e de que estética. O relvado do campus, naquela manhã soalheira, estava deserto, quem passava por lá ia sempre apressado, concerteza à procura da eficiência que lhe foi sugerida por qualquer economista neo-clássico. Para que tipo de Homem foi aquele espaço feito? Nâo consigo compatibilizar o local com algumas coisas simples da vida na Berna: cadeiras amarelas, imperial ao fim do dia, galos, galinhas, gatos (há quem jure que já lá viu um rebanho de ovelhas) , o sol, a luz, perder tempo a conversar sobre o sexo do anjos, o empate do Benfica e a crise mundial (ou a ganhar tempo, perdoe-me o Bentham e os seus correligionários). Garanto-vos que isto não é a conversa da esquerda preguiçosa. Podia ser, mas não é. Estou plenamente convencido que podemos ser os melhores do mundo num espaço que não seja concebido pelos ditames da racionalidade fria. É a velha questão das aparências. Não precisamos de um oceano de linhas rectas imaginadas por um qualquer arquitecto aborrecido que nunca percebeu o estranho prazer de entrar num caminho que não vai dar a lado nenhum, mas do investimento do Estado, ou melhor dos cidadãos que pagam impostos, que permita aos recém-licenciados, pelo menos os que desejarem, dedicarem-se a trabalhar naquilo que aprenderam durante os anos do curso. No declive de Campolide as Ciências Sociais vão ficar na parte de baixo. Temo que em breve se transformem definitivamente nos tarefeiros dos senhores das gravatas que habitam a parte de cima; estudar o Homem desde que não ofenda o velho paradigma utilitarista do mundo. Ciências Sociais aplicadas.

Liberdade

“Nunca se repetirá vezes suficientes que nada há de mais fecundo e maravilhoso que a arte de ser livre, mas nada tão duro como a aprendizagem dessa liberdade. Não é isso que sucede com o despotismo. O despotismo apresenta-se muitas vezes como o reparador de todos os males; é o apoio do direito justo, o que protege os oprimidos e o garante da ordem. Os povos adormecem-se no seio da prosperidade momentânea que produz, e quando acordam são miseráveis. A liberdade, pelo contrário, nasce frequentemente entre tempestades, estabelece-se trabalhosamente e com discórdias civis, e só quando já é velha se podem conhecer os seus benefícios.”
Alexis de Tocqueville, Da Democracia na América, 1831

domingo, outubro 12, 2003

O monstro e o seu criador

Tenho uma dúvida constante em relação ao desempenho do sistema de justiça, especialmente quando estão ao barulho grandes interesses políticos e económicos. A independência dos poderes é uma base do Estado de direito, mas isto é o que está escrito. Partindo deste pressuposto resta-nos esperar que a justiça funcione, sem linchamentos ou absolvições públicas. Que esta esperança não seja, porém, demasiado ingénua. No meio das declarações dos inúmeros actores que vão intervindo diariamente no processo mediático da Casa Pia, retive uma frase do advogado de Carlos Silvino. Disse o senhor que os actos do denominado Bibi não são explicáveis, apenas, através das suas indiossincracias individuais; Bibi é uma criação do ambiente da Casa Pia, onde viveu desde os quatro anos num clima de abuso sexual constante. Sem pretender absolver os actos do seu cliente, o advogado abriu os horizontes para uma análise histórica da instituição, das relações políticas que enquadravam uma situação impune, que vinha de longe, de bem dentro do Estado Novo salazarista. Para quem pensa que a mudança se faz por decreto, note-se como algumas continuidades sobrevivem com facilidade a processos políticos e a aparentes mudanças civilizacionais.

sábado, outubro 11, 2003

Achei genial

Cito aqui o blogue "a cagada" pois achei, simplesmente, genial: "85% do corpo diplomático apoia a escolha da Dr. Teresa Patricio Gouveia para ministra dos Negócios Estrangeiros. A razão principal têm a ver com o facto de normalmente as ministras escolherem assessores jovens e bonitos." Eh Eh

quinta-feira, outubro 09, 2003

GNR

De acordo com informações prestadas pelo ministro da Administração Interna, a colocação de militares tugas no Iraque, comportará ao erário público 427 mil euros por mês para manter os 130 homens e mulheres. Quanto ao investimento em equipamento, o governante avançou com o valor de 7 milhões e 777 mil euros.
Figueiredo Lopes adiantou igualmente o valor do suplemento a que os militares destacados vão ter direito. Serão 2490 euros por mês, tanto para oficiais como para praças. O seguro de vida será também igual para todos.

É esta uma parte dos encargos que os contribuintes portugueses têm de suportar para que o governo prossiga a sua generosa e cordata atitude de legitimação de uma invasão e ocupação estrangeira do Iraque e para que algumas empresas de construção civil e bancos portugueses dali recolham muitas pepitas de ouro.
Entretanto continuamos a aguardar que o governo português discorra sobre a fundamentação das provas que o conduziram a apoiar o ataque. Para quem brandiu aos sete ventos a iminência de um apocalipse nuclear acaso não ocorresse a invasão, seria de esperar que maior desvelo tivesse sido posto na apresentação de argumentos irrefutáveis desse perigo. Em vão, até hoje ...

quarta-feira, outubro 08, 2003

Orçamento de classe

Não conheço em pormenor a proposta de orçamento de Estado para 2004 feita pelo nosso governo. As notícias não são, porém, as melhores. Na lógica de desinvestimento estatal que caracteriza a política macro-económica deste governos são áreas sensíveis e prioritárias para o bem estar geral, como são os casos da saúde e da educação, que vão sofrer os maiores cortes. O governo, liderado por um partido que se diz social-democrata, desfere um rude golpe no quotidiano dos mais fracos. Neste sentido, é um orçamento de classe. Da classe que sem qualquer dúvida domina o aparelho estatal.

terça-feira, outubro 07, 2003

Sobre a crítica política

Considero que aquele que critica politicamente deve recordar-se que esta crítica não é um fim em si mesmo. A crítica desmonta discursos, clarifica posições e mesmo quando não aponta alternativas, arrepia caminhos. A satisfação com os jogos de linguagens proporcionados pela crítica é perversa, porque autonomiza de tal forma o discurso que transforma o empenho em intervir sobre o real num simples exibicionismo identitário. A crítica deve esclarecer e para isso deve ser sólida e estar sujeita à verificação. Tenho dificuldades em perceber totalmente o que é o capitalismo, mas tanto aqueles que o combatem, como os que o defendem, parecem compreênde-lo de forma tão perfeita que estão dispostos a jurar pela alma da mamã que ele é ou Deus ou o Diabo. Também considero complexo interpretar todas as dimensões da globalização, se tem um lado emancipatório, ou se é predominantemente predadora. Ando lento. Na minha fraca opinião, a crítica do slogan não nos leva longe. Os novos slogans da esquerda correm o risco de ser tão vazios como os velhos. A crítica tem que soltar o conhecimento, deve criar pessoas capazes de interpretar e analisar, e não repetidores de chavões que se auto-caracterizam por balizas ideológicas que nem sabem muito bem explicar o que são.
A crítica tem que ser mais complexa. Desconfio dos discursos radicais. A inteligentsia da direita, em resultado de ter poucas pessoas com pelo menos duas ideias, está repleta de ex-radicais de esquerda, esquerdistas. Os esquerdistas são maus, os que já saíram e os que se mantêm, porque quanto maior o seu exibicionismo retórico mais longe estão da solução dos problemas reais. Em certo aspectos parecem-se muito com a velha direita. Tão inúteis como os optimistas que acham que o capitalismo se anula por decreto e no dia a seguir nasce o Homem novo, são os cépticos. Normalmente o céptico é o tipo que está porreiro da vida mas que acha que se deve apresentar ao mundo como um gajo chateado. Os cépticos são um género de sub-cultura da burguesia, onde ninguém tem que levantar o cu da cama às cinco da manhã para ir trabalhar na fábrica. No fundo, dá um charme do caraças ser céptico, além disso dá pouco trabalho.
A crítica política tem que ser emancipadora. Isso só se consegue se for estruturada a partir do conhecimento do real. Seguindo esta premissa, penso que a esquerda parte com uma vantagem gigantesca sobre a direita.
Megacities
Merece uma visita este documentário que está em exibição no Cine-Estúdio 222, da autoria do austríaco Michael Glawogger. Nomadismo fílmico sobre a vivência de pessoas em 4 megalópoles da Economia-Mundo (Nova Iorque, Moscovo, Cidade do México e Bombaim), eis um retrato pungente e desassombrado de espaços infinitos que embaciam os sentidos e manietam os destinos.
Aqui não se vendem hot-dog´s na rua, vendem-se patas de galinha em copos de plástico com molho de limão. Os miúdos não vão ao Toy´s Rus, esperam ansiosamente pelo vendedor ambulante de pintaínhos. Não há "vedetas" de telenovelas que mostram às revistas o novo interior das suas casas com piscinas, há jovens que mostram o interior da rede de esgotos onde vivem. Há também aqueles que recolhem, transportam e pisam o lixo que recebem das suas incursões diárias pelas bairros escavacados e andrajosos, e que vão depois jogar futebol, não para os relvados ou os pelados, mas para a lixeira.
Estes e muitos outros cenários de uma realidade que exige um despertar imediato de um torpor colectivo que as narrativas imagéticas exibidas mostram à evidência.
Enquanto assim não for, tem razão o fantasma Barrio, e o Absurdo continuará a fazer parte do património cultural da humanidade.